sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Adormecidos

Leticia Brito
Quanto silêncio nesse bar...
Enquanto a juventude dança celebrando a vitória dos hormônios sobre os sentimentos eu, quieta num canto, ouço a musica e começo a me indagar: Quando foi mesmo que deixamos de amar?
Na verdade nunca nos arriscamos a sentir nada mais profundo do que um orgasmo de quinze minutos. Tudo ao meu redor é tão futil que eu gentilmente me entrego ao prazer da minha solidão.
Ao meu redor todos estão adormecidos, sinto como se estivesse dentro de uma casa de bonecas onde todos são belos e plastificados, onde as pessoas possuem a pele lisa e o coração duro. Como posso eu fugir desse mundo se dentro dele não existe presença de um alguém de carne que me estenda a mão?
O mal do século não é a solidão, o grande mau é a juventude que tão banal em seus costumes acredita que o amor é uma prisão, sem saber que na verdade ele é a forma mais pura de se encontrar a liberdade.
Enquanto eu reflito todos dançam ao meu redor e eu no meu canto, perdida neste bar, só posso me pensar: Eu deveria mesmo aprender beber.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Brasil, meu anti-herói



Surrupiado desde o princípio
Eternamente surrupiado
Gigante pela própria natureza, porém, um rato pelo próprio caráter
Deitado eternamente, por não o deixarem levantar
Dos teus filhos que não fogem à luta, a maioria está cansada
– é uma luta sem trégua
Mãe pouco gentil tem sido com os filhos deste solo
– se lhes dá a liberdade, nega-lhes oportunidade
Deste mau exemplo e criaste o mau costume
Corrompe-se passivamente como uma puta
Reduz-se a dar-se por satisfeita com o “rouba, mas faz”
Tu que sempre dá um jeitinho em tudo, parece não ter jeito
Sua famigerada malandragem, é sua própria ruína
Negando a si mesmo o direito de ser respeitado,
Com indiferença os teus filhos tem tratado

Poema vertiginoso

Convivendo dia e noite com a agonia de ser o que não é
Como verme a rastejar, de podres restos se nutriu
Febril e desolado,
Pobre diabo se tornou
Entre a reluzente lucidez e o nebuloso e inquietante delírio
Sempre a trilhar a beira do abismo
A sentir-se culpado pelos erros não cometidos
Ao ostracismo condenado sabe lá por quem...
A pecar sem temor
A violar sem pudor
Na penumbra a tatear, pelo eu perdido a buscar
Em si mesmo retraído,
A sonhar com a imperfeição que o faria perfeito
Ruminando as perdidas chances que o desfrute a sorte lhe negara
Exilado de si mesmo,
De tudo duvidando,
Apostando em qualquer coisa

Solidão – a dor que mata

A dor latente
A dor reprimida
A felicidade fingida
O laço da morte
O corpo suspenso
A notícia se espalha,
O povo se junta
Rumores
O esquecimento no dia seguinte
A eterna indiferença
A paz indesejada
A dor interrompida
Bastou-lhe meio-século de vida...

domingo, 13 de setembro de 2009

Remanso

Pequena e acanhada
Arrancada do seu berço
Jogada ao relento
À esquerda do velho pai
Pai violentado
Tão festiva quanto decadente
Orgulhosa da própria estupidez
Recorda-me Gregório de Matos – “Triste Bahia!”.
Bahia do lado de cá
Estagnada como o próprio nome sugere,
Culturalmente estagnada
De um sol intenso e de uma fisionomia imutável
Pouco ousada é sua gente
Catolicamente hipócrita
Hipocritamente católica
De uma classe média de novos-ricos, e politicagem oportunista.
Deste filho bastardo receba tão árdua contemplação

Provinciano

Da aridez hostil brotou o cacto
Do cacto hostil brotaram poucas flores
Enfim, fez-se o homem forte.
Forte e curvado
Forte e arrebatado

Mira o futuro,
Mas o futuro se dispersa
Extrai de si mesmo a força que necessita
O pouco lhe basta
O excesso lhe sufoca

De aspecto agressivo
De conteúdo abundante
Criou-se da escassez,
Mas a ela não se conteve
Reciclou o sabugo
“Viajou na maionese”
Rompeu com o sagrado
Libertino libertado

Agridoce na essência
Move-lhe o tesão pelo desafio,
Pelo bizarro,
Pelo belo,
Pelo proibido
Do piegas nasceu o lascivo
Lapidou por si só o que tinha de tosco
Manteve tosco o que tinha de ser

Provinciano atrevido
Provinciano e decadente
Olhou para fora
Quis saber mais
Digeriu o proveitoso
Cuspiu as sobras
Vomitou o que havia sido imposto
Odiou a indiferença,
A hipocrisia repugnante

Sóbrio
Embriagado
Um pouco de Deus
Um tanto de Diabo
Tens o amor
Ama todas as cores,
Todas as formas – cada uma é especial,
Causam diferentes prazeres

Ardeu no ermo
Renasceu
Para si
Para o mundo
Respirou da secura do pó,
E do pó se fertilizou
Deu vida
Espantou a morte